quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Festival Cruilla Barcelona 2012 c/ Stooges, Gogol Bordello, Specials etc 07/07/2012 - Parc Del Forum - Barcelona/Espanha

PRIMEIRO DIA - 06/07/2012

No último fim de semana e primeiro do mês de Julho, tivemos a oportunidade de, pela primeira vez em cinco edições, participar do festival Cruilla Barcelona, realizado no mesmo local de muitos outros, o Parc del Fòrum, entre eles o também coberto por nós, Primavera Sound.

Um festival jovem no que podemos dizer tradição mas que já leva em seu curriculo nomes como Ben Harper, Public Enemy, Love of Lesbian, Asian Dub Foundation, Jack Johnson, entre outros. E este ano não foi diferente com atrações como Iggy & The Stooges, Cypress Hill, M.I.A., The Specials, Sharon Jones e Arnaldo Antunes junto a Edgard Scandurra e Toumani Diabaté.

Podemos destacar também a honestidade do público junto ao festival. Um evento mais compacto que outros, sem grandes dimensões ou excesso de palcos e que fazem com que poucas apresentações coincidam, dando liberdade do mesmo assistir a quase tudo sem grandes sacrificios. Contando com preços bem acessíveis para os dias do evento e muita gente local, com poucos estrangeiros, sem as tradicionais etiquetas musicais e pessoais e livre do fashion que tanto assola estes eventos.

Já na primeira hora da sexta-feira tivemos num pequeno palco chamado Cases de la Música o verdadeiro rock and roll de Los Tiki Phantoms. Uma verdadeira orgía surf-music com personagens criados e representados por seus integrantes, algo como após passar dois séculos enterrados embaixo de um vulcão vêem a luz do mundo e saem em turnê uns esqueletos com instrumentos em punho. A banda participou pelo segundo ano consecutivo do festival e desta vez apresentando seu novo álbum, Mueven el Esqueleto. Pelo horário e dia até que o público compareceu para participar da festa, fazer um trenzinho com o baixista e ainda com que uma fã passeasse pelo público com um colchão inflável. Apesar dos títulos das músicas serem em sua grande maioria em espanhol como "Ay Caramba", "La Conga", "Fuego", "El Pulpo" e "Bala de Plata", suas canções são intrumentais, o que de verdade aumenta a diversão.

Para nossa primeira visita internacional da noite tivemos no palco Estrella Damm,Iggy & The Stooges e mais uma vez foi de tirar o chapéu. Já tinhamos acompanhado de perto seu show ano passado no Hellfest mas em 2012 parece ter sido mais intenso já que o palco se situava num tipo de arena e a galera estava mais proxima, menos dispersa podemos dizer.

Abrir a noite, que na verdade ainda era dia apesar do relógio marcar 21:00 com "Raw Power" é de estremesser tudo e fazer os fãs mais assíduos e de cabelos grizalhos mostrarem que a galera old school é quem comanda a festa no momento. Não satisfeitos, um "Search and Destroy" junto a um Iggy que de "pop" nunca teve nada. O "rapaz" continua pisando forte no acelerador, um verdadeiro show. Iggy, com suas tipicas caretas e cusparadas ainda praticou um stage dive já na metade do show, o que o deixou com a boca sangrando. Nada que incomodasse.

O desfile de clássicos parecia interminável som "Shake Appeal", "Fun House", "No Fun" e o cover de "Louie Louie". Faltou mesmo "1969" para completar a festa mas vê-lo interpretando "1970", apenas um ano de diferença, dançando junto a parte de seus fãs que ele mesmo convida ao palco já é o suficiente.

Pouco depois conferimos a cantora Nneka, considerada o segredo mais bem guardado da música negra atual e comparada a Lauryn Hill e seu hip-hop soul. Nascida na Nigeria e residente na Alemanha, a moça capricha nos seus discursos ativistas entre uma canção e outra, entre elas "My Home", todo um hit.

Para finalizar nossa participação neste primeiro dia tivemos Gogol Bordello e seu "gipsy punk", grupo que mistura o punk com a música Balcânica. Um espetáculo frenético e de grande aceitação por parte do público, até mesmo por ser um grupo multicultural, algo bem Barcelona por sinal. A mesma se apresentou no Rock in Rio Madrid no dia seguinte. Está aí outra banda que seus shows são mais atrativos que suas versões de estúdio e músicas como "Start Wearing Purple" e "Ultimate" encaixam perfeitamente junto a "Wonderlust King" e a audiência da noite.

 Com a mesma dada como ganha e no caminho das placas que indicavam a saída fui atraído por fantásticas vozes africanas, o casal de cegos Amadou & Miriam, provenientes de Mali. Os célebres já tiveram colaborações musicais de Mano Chao e Damon Albarn em algumas de suas canções. Acho que não fui o único atraído por estas cordas vocais.

Tão bonita quanto suas músicas são suas histórias de vida, vale à pena conferir.



  SEGUNDO DIA - 07/07/2012  Abrimos o segundo dia de festival no mesmo palco e horário do dia anterior, sob o mesmo sol e algo de calor mas desta vez para assistir a dois ícones da música brasileira junto a outro da africana.

Arnaldo Antunes & Edgard Scandurra com a participação de Toumani Diabaté (ou vice-versa), conhecido por tocar um instrumento chamado Kora e que o fez vencedor de dois Grammys de melhor álbum de música tradicional, apresentaram ao Cruilla seu trabalho A Curva da Cintura que, segundo as palavras de Diabaté demonstra que a música é acima de tudo uma linguagem universal.  O africano também tinha um motivo extra para a felicidade, seu filho compartilha o palco tocando o mesmo intrumento.  A apresentação começou bem serena e com um público atento ao que ocorria. Scandurra e Toumani mais calados e Antunes bem comunicativo, principalmente num momento em que o público, apesar de bem no inicio, começava a dar sinais de tédio com aquele bate-papo de barzinho enquanto a banda está no palco fazendo uma trilha sonora de suas histórias. Nada que nossos protagonistas não saibam lidar após anos de experiência. Talvez pelo nosso idioma não ser tão popular assim a ponto de não despertar interesse e o sentimento de muitos que ali estavam com seu cigarro e cervejinha nas mãos ao menos para entender o que a grave voz de Arnaldo Antunes traduzia em belas palavras. Quando o trio e sua banda engrenou uma fusão mais rock com Scandurra caprichando nos solos e Antunes em sua performance de palco o público finalmente se rendeu e compreendeu que diante deles existia uma história musical que desconhecem mas que despertou interesse.

Resumindo, Arnaldo, Scandurra e Diabaté levaram com maestria um público curioso que quase se deixa levar por um momentâneo desinteresse, algo que somente artistas como estes, únicos e inconfundíveis conseguem produzir.  Ainda que o publico tenha se animado e mudado de atitude diante do cover "Elisa" de Serge Gainsbourg, teve certa de decepção ao descobrir que estava traduzido para o português. Algo como provar do próprio remédio num país onde a rainha Elisabeth se chama Isabel pelo simples fato de que tudo é traduzido, incluindo nomes.

  Com o tempo justo conferimos no palco principal Linton Kwesi Johnson, considerado o Leonard Choen da música jamaicana e uma das figuras chave da evolução do reggae nos últimos anos. O rapaz de 60 anos, com seu chapeuzinho estilo samba de raiz deu uma aula de sociologia em forma de música com seus discursos ao melhor estilo Panteras Negras (do qual foi membro), tentando conscientizar o público sobre o que verdadeiramente protestou e protesta sendo imigrante jamaicano fincado em Londres desde os anos 60. Para um sábado de verão e uma brisa diante do mediterrâneo, melhor lugar não há para colocar o cérebro em funcionamento.

E já que o reggae, soul, dub caminhavam juntos pelo festival levados por nomes de histórias próprias, porque não estar diante da apresentação daqueles que são considerados os pais do ska? The Specials deram fim a uma inatividade de anos para há três voltarem a ensaiar e participar de festivais no Japão, Austrália e Europa, incluindo o show de encerramento das Olimpíadas de Londres junto a New Order e Blur. Neste meio tempo passaram por Barcelona para tocar clássicos como "Do the Dog" e "(Dawning Of A) New Era". Num show pra lá de alto nível, demonstraram estar em forma e deixaram o clima pra lá de positivo.

Na sequência pairava no ar a primeira estrela do festival, M.I.A.. Digo estrela não pelo que representa para a música atual mas sim pelo que pensa ser. Apesar de Iggy ter solicitado que os fotógrafos assinassem um contrato contra a publicação de sua imagem de forma indevida (calendários, posters, etc) e do Cypress Hill demorar a responder se os mesmos (fotógrafos) teriam direito de trabalhar à vontade, foi a senhorita M.I.A. que mais torrou a paciência com suas exigências. Primeiro não queria os fotógrafos profissionais, depois recuou e permitiu. Porém para os fãs do gargarejo, acostumados com suas fotos via telefone, foi totalmente proibida a captação de qualquer tipo de imagem, com direito a bronca dos seguranças. Talvez o fato de ter gravado com Madonna e toda badalação à seu entorno sobre suas misturas de hip hop com nosso funk carioca tenha queimado os neurônios de Mathangi Maya, seu verdadeiro nome. Para complicar um pouco mais as coisas, os primeiros 15 minutos de show quem esteve no palco enchendo linguiça foi a DJ e para quem pagou para assisti-la, além de um curto show por se tratar de festival, sua apresentação deu a sensação de participação, daquelas em que o artista dá uma palhinha. Particularmente não tenho nada contra a M.I.A. e até estive presente num bom show que ofereceu em Barcelona há uns dois anos, onde o lado político de suas músicas era mais destacado. Não que após "Paper Planes" e "Bucky Done Gun" o público tenha reclamado mas ao subir para o show da Sharon Jones & Dap Kings e ver a re-encarnação de James Brown de saia deu aquela sensação da brincadeira que fizeram na internet após o fraco (ou louco) show da Claudia Leite no Rock in Rio ano passado, "senta ali no cantinho e aprende como se faz!". A senhora Jones trouxe felicidade e beleza para a noite, bom demais.

Para finalizar nossa participação e a de muitos outros, os californianos do Cypress Hill nos visitaram mais uma vez. Com um setlist muito parecido ao apresentado aqui em 2010 e ainda com um show calcado em seu último lançamento, Rise Up. Abriram com o mesmo sampler e a todo gás com "Get 'Em Up". B-Real em solitário num primeiro momento deixando Sean Dog cobrar protagonismo na segunda parte da música e sua entrada triunfal. Diversão tinha nome e estava no palco. "When the Sh.. Goes Down" deixa o público em êxtase com direito a B-Real e seus gestos marijuaneros. Durante uma hora e meia a dupla deixou claro que ainda tem muita lenha e folha para queimar e o público acompanhou sem desperdícios. Algumas músicas cantadas em espanhol como foi "Yo Quiero Fumar (I Wanna Get High)" outras em inglês como "Hits From The Bong" e seu tradicional cachimbo no palco para fazer um pouco de fumaça e até uma pareceria com Snoop Dogg na música "Vato", além de uma referência ao Public Enemy com um trecho de Bring The Noise deixando a galera com um largo sorriso.

  O grande finale ficou por conta de "(Rap) Superstar". É engraçado ver uma banda que estourou para o mundo com "Insane in the Brain" conseguir livrar esta música de uma etiqueta e não deixa-los marcado como "aquela banda daquela música tal" mas cair na armadilha com "(Rap) Superstar", nada grave. No meio tempo ainda tivemos "Cock the Hammer", "Rise Up", "Tequila Sunrise" e "Dr. Greenthumb" entre muitos e muitos outros já clássicos do hip-hop. Incansáveis e alto nível mais uma vez.

Agora me diz: Com toda a história do Cypress, tanto musical quanto a dura realidade das ruas de Los Angeles, respeitado entre os amantes do rock, do rap e de tudo...porque não existe uma "marra" e exigências na dupla? Artista para exigir tem que ter banca mas normalmente é assim, como mostram pouco no seu oficio, de algum lugar tem que chamar atenção.

Esta aí uma boa pedida aos viajantes para o próximo ano, o Cruilla demostra sinceridade e pés no chão.

Até a próxima.
Enviado por Mauricio Melo

Confira fotos desse show, por Mauricio Melo:



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