domingo, 17 de agosto de 2008

The Mars Volta - Brincando com espíritos.

Os marcianos e sua tripulação desembarcaram em Barcelona, dispensando banda de abertura e dando pista de que o ritual seria extenso. O que se testemunhou na sala Razzmatazz foi algo para realmente não ser esquecido.
Texto e fotos: Maurício Melo
THE MARS VOLTA
Sala Razzmatazz, Barcelona1/3/2008
Brincando com Espíritos
Omar Rodriguez Lopes (guitarrista) e Cedric Bixler Zavala (vocalista), podem orgulhar-se de novamente fazer parte de uma das grandes e influenciadoras bandas do momento. O mais uma vez se deve ao fato de serem ex-integrantes de uma das melhores e merecidamente reconhecidas bandas de post-hardcore que existiram, o At-The Drive In. O momento mais difícil aconteceu quando a banda acabou e a dupla embarcou neste então projeto chamado The Mars Volta. Os primeiros shows, quando ainda lançavam De-Louse in the Comatorium [2003], eram marcados por um público de curiosos e de "viúvas" do ATDI. A gravação e produção do quarto álbum de estúdio, The Bedlam In Goliath [2008], um disco mais direto e agressivo do que os anteriores, foram marcadas por curiosos fatos. O canhoto guitarrista Omar Rodrigues adquiriu uma tábua de Ouija (uma superfície plana com letras, números ou outros símbolos em que se coloca um indicador móvel, utilizada supostamente para comunicação com espíritos. No Brasil, algo parecido com a brincadeira do copo ou da tesoura). Após jogar com essa tábua, uma série de fatalidades se seguiu: inundações de estúdio, vocalista com inexplicáveis doenças, e mais, o engenheiro de som simplesmente enlouqueceu, dizendo que a banda havia gravado músicas diabólicas com intenção de enlouquecer pessoas e fazer mal ao mundo e tentou destruir as masters das gravações - o material foi recuperado à tapa. Por fim, o tabuleiro foi enterrado (mesmo o grupo dizendo não acreditar “nessas histórias”) e no encarte do disco foram colocadas fotos de santos para limpar o astral.
Sob essa expectativa, jogada de marketing ou não, o Mars Volta e sua tripulação desembarcou em Barcelona, dispensando banda de abertura e dando pista de que o ritual seria extenso. O que se testemunhou na sala Razzmatazz foi algo para realmente não ser esquecido. Com suas fusões de estilos, improvisando jazz, progressivo, uma criatividade e fantástica evolução musical, um verdadeiro voodoo sonoro. Indescritível a sensação de arrepio que subia da cabeça aos pés ao apagar das luzes dando início a esta experiência musical da qual faziam parte banda e público.
Abrindo com "Roulette Dares" (The Haunt of) do álbum De-Loused in the Comatorium [2003], Omar Rodriguez e Cedric-Zavala duelavam em jams que pareciam infinitas, Zavala vestido a caráter setentista, camisa negra de bolinhas brancas, entrava em êxtase com uma performance que lembrava Robert Plant no auge do Led Zeppelin. Ao lado, Omar se contorcia, cambaleava nos momentos mais distorcidos e violentos de sua guitarra para em seguida relaxar em calmaria. Dando sequência com "Viscera Eyes", do disco Ampucteture [2006], a esta altura já éramos todos marcianos, a euforia se apoderou do público de forma inexplicável. Colocando em prática novos experimentos como "Wax Simulacra" e "Ouruborous", ambos do já citado disco de lançamento, a recepção foi calorosa. Juan Alderete (baixo), Ikey Owens (teclados), Marcel Rodrigues Lópes (percussão), Tomas Pridgen (bateria), Adrian Terrazas (saxofone tenor, flauta, clarinete baixo, e percussão adicional) e Pablo Hinojos Gonzáles (engenheiro de som, percussão) davam um show à parte, principalmente os dois últimos, que se revezavam entre muitos instrumentos. A trupe não trocava uma palavra no palco, nem mesmo se comunicava com o público, trocavam olhares ou atiravam pequenos objetos uns aos outros. Ao centro, a dupla protagonista dava um show extra, o som ecoava de maneira sólida e preenchia todas as partes do recinto, alimentando quem estava ali, ávido. Após duas horas de concerto, quando "Cygnus...Vismund Cygnus", do álbum Frances The Mute [2005], foi então executada, algo a mais foi posto em prática, na metade da música, quando começa uma tranqüila viagem: Zavala parece enlouquecer, golpeava o pedestal ao solo, agitado, caminhava sem direção, gritava ao além, escalou uma coluna de amplificadores, arremessou copos (plásticos), retornou ao palco, chutou um banco e depois se debruçou nele e finalmente deu um stage dive. Enquanto isso, Omar observava tudo alheio, extraindo de sua guitarra tudo o que ela podia oferecer. Àquela altura tudo era possível, parecia o fim de tudo - mas não. O ritual ainda seguiu por mais uma hora, com direito a uma seção acústica em castelhano para "Asilos Magdalena" cantada em uníssono, simplesmente emocionante. Seguiram com a melancólica "Miranda That Ghost Just Isn´t Holy Anymore" [Frances the Mute]. Se despediram com "Day of the Baphomets", Amputechture [2006] depois de três horas de show e uma experiência única nos dias atuais. Por fim, uma saudação ao público, Omar colocou seus óculos, se despediu com um simpático sorriso e com a cara de que por ele, ficaria ali, tocando sua guitarra até o dia amanhecer.
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