sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Du Baú - Anti-Flag entrevista - 2009


ENTREVISTA ANTI FLAG
Entrevistado: Pat Thetic (baterista)
Por Mauricio Melo

O grupo norte-americano Anti-Flag já pode ser considerado referência na cena punk-rock mundial.  Surgido em pleno governo Clinton, teve no seguinte administrador, George W. Bush combustível de sobra para seus protestos.  Após passar por uma grande gravadora com dois bons discos, retornam à independência e apresentam The People and The Gun com o esperado retorno às raízes.  Entre o show da tarde onde a banda homenageou The Clash e o principal durante a Eastpack Antidote Tour, tivemos a oportunidade de entrevistar o baterista Pat Thetic sob um céu aberto na primeira noite do tenebroso frio europeu na cidade de Barcelona.  Os melhores momentos você confere abaixo. 


1 - Podemos começar nossa entrevista falando sobre o novo disco The People and The Gun?  Algumas pessoas estão comentando que a banda voltou às raízes com este álbum.  Sem tentar provar algo musicalmente, apenas fazendo o que as pessoas realmente estão esperando?
Não necessariamente tentando fazer o que as pessoas estão esperando, não nos importamos com isso.  Como posso dizer... quando estávamos numa grande gravadora haviam "muitos cozinheiros na mesma cozinha".  Tinha muita gente envolvida e nós também tivemos acesso a diferentes idéias.  Para ser sincero existia dinheiro para uma orquestra ou  coisas do tipo.  E quando gravamos The People and The Gun não existia tanta gente e consequentemente tanto dinheiro, bancamos praticamente tudo.  Foi sentar e conversar temas como "o que realmente queremos fazer e o que nos faz feliz?".  E o que nos faz feliz é estarmos em nossa sala de ensaio tocando punk-rock e sem interferencias.  Então decidimos que assim seria.  Compramos equipamento de gravação e gravamos em nosso lugar de ensaio, somente nós e mais ninguém.  Gravamos sem intensão de fazer experimentos musicais ou tentar provar algo a alguém,  algo que realmente gostamos. 

2 - Algumas bandas tiveram más experiencias com grandes gravadoras.  Contam que em grandes gravadoras as pessoas estão mais preocupadas em manter seus cargos do que trabalhar em algo que realmente gosta e talvez por isso exista pressão.  Na RCA voces tiveram algum tipo de pressão?  
Acontece este tipo de comportamente sim e aconteceu com a gente.  Todas as pessoas que trabalharam conosco perderam seus empregos.   Foi curioso porque a pessoa que nos contratou entendeu nossa proposta.  Algumas pessoas mantiveram distancia porque sabiam que não mudaríamos nosso discurso mas mesmo assim todas estas pessoas foram demitidas, é assim numa gravadora como a RCA, classicamente grande.  Então para o segundo disco nesta empresa foram contratadas novas pessoas que não tinham nada a ver com nossa contratação inicial.  Apesar disso, são pessoas muito legais.  A instituição não é legal, a tentativa de manipular grandes audiências não é legal mas individualmente existem pessoas interessantíssimas por lá.  Realmente as pessoas priorizam seus cargos, ainda mais neste tipo de economia onde atualmente a música é o que menos importa para muita gente.  Uma das coisas que comentei quando fomos contratados é que garanti que continuaria empregado por muito tempo.  Fomos a reuniões com diretores da gravadora, com pessoas que recebem ao mês um salário que nunca tive na minha vida, nem economizando para isso.  Porém eles não sabem por quanto tempo tem seus empregos garantidos e eu como músico sim, posso continuar com meu estilo de vida.  

3 - Como foi trabalhar com Tom Morello e se tivesse a oportunidade de voltar a trabalhar com ele, o faria?  Trabalhar com Visconti foi mais fácil ou simplesmente diferente?
É um cara incrível.  Muito inteligente, criativo, conversa com todos, é uma pessoa de fácil acesso.  Já trabalhar com Visconti é diferente.  Morello é como se fosse um líder espiritual e Visconti é mais mãos à obra.  Trabalha continuamente em diferentes pontos de vista.  Entende bastante de música teoricamente e consegue transpor as idéias para a gravação, ainda que exista diferentes e atípicos instrumentos.  Tivemos sorte em encontrá-lo livre e trabalhar com ele.    

4 - Para uma banda com o perfil do Anti-Flag não poderíamos fugir da pergunta.  Após serem duros críticos do governo Bush, recheio para qualquer banda punk, qual a visão do novo governo (já nem tão novo assim) e as expectativas?
Apenas para dar uma perspectiva.  Anti-flag nasceu durante o governo Clinton.  Tivemos Bush pai, Clinton e depois George W. Bush.  Então tem muita gente pensado que somos uma banda contra W. Bush mas não é assim.  Somos contra a concentração de um poder nas mãos de algumas pessoas.  É claro que os piores fatos aconteceram durante a administração de Bush mas a época de Clinton também não foi "divertida".  Então, após tudo isto o que podemos dizer é que  Obama tem grandes idéias e boas intensões porém a realidade ainda deixa a desejar.  Somos bastante realistas e sabemos que houve promessa de retirar tropas do Iraque mas as tropas continuam por lá.  Que a situação no Afganistão iria melhorar mas a situação está pior do que antes.  Os americanos ainda não tem saúde pública como prometido.  Muito dinheiro para os bancos, os direitos homosexuais ainda não funciona como prometido, etc, etc.  
Sabemos que uma grande expectativa pode gerar grandes decepções se as pessoas não tiveram paciência...  Claro, isso também.  Mas é uma faca de dois gumes.  O que aconteceu há um ano atrás?  Ok, Bush se foi e ficamos felizes.  Nos organizamos e trabalhamos para colocar na Casa Branca alguém que poderia progredir e de repente todo mundo relaxou e ficou aquela sensação de "dever cumprido".  Temos lá alguém que escolhemos e que entende nossas necessidades.  Então não devemos trabalhar mais?  Ele não está fazendo o trabalho que esperávamos e acredito que em breve existirão protestos nas ruas novamente.  Concordo que não se corrigem graves erros de anos e anos em um ano e talvez seja isto que nos conforma um pouco.  Esperamos olhar para trás daqui a uma década e perceber que houveram mudanças.

5 - Sem o governo Bush a banda passa a desviar um pouco seu alvo?  Qual o alvo principal para este disco?
Sempre temos um alvo para as letras.  Você olha a sua volta em qualquer parte do mundo e há injustiça.  Caminhei por Barcelona hoje e vi que existem injustiças que nos inspiram a qualquer momento.  Não falamos só da política.  Em todos os lados existe mais poder concentrado nas mãos de algumas pessoas erradas.  Então estamos sempre em busca de dividir melhor este poder.  Tanto faz se é Obama ou Bush, estão sempre tentanto colocar o poder no alto de uma pirâmide e isso não é bom para ninguém.  Quanto mais vozes, melhor distribuido será a força e mais pessoas poder chegar a igualdade.  

6 - Anti Flag foi considerada por muitos como uma banda anti-americana ou anti-nacionalista.  O primeiro disco após os ataques de 11 Setembro foi o Mobilize.  Foi um desafio muito grande demonstrar a sua própria nação que a posição da banda não era definitivamente aquela ou foi mais fácil de demonstrar o que realmente a banda queria transmitir?
Bem, não sei se concordar com você mas realmente tinha chegado o momento de tomar uma posição.  Temos que ter orgulho das coisas boas que fazemos.  Não escolhi nascer americano, apenas aconteceu.  O que tenho orgulho é de ter dito NÃO! quando as pessoas diziam que o correto era matar e bombardear pessoas porque estas pessoas fizeram o mesmo conosco.  Isso não faz o menor sentido e tenho orgulho de ter tomado esta posição.  O Anti-Flag não é um grupo para ser anti-americano, anti-latino, anti-britânico ou anti-russo.  Somos anti-poder e concentração do mesmo nas mãos de um pequeno grupo, é assim que protestamos.  O nome Anti-Flag é exatamente contra o fronteirismo, a divisão de territórios onde o símbolo é uma bandeira.  Não importa onde nascemos ou deixamos de nascer, não queremos divisões.  

7 - Apesar da grande influência do Clash, como a que vimos no show de hoje à tarde, tenho a informação de que para este disco novo a banda passou por  uma grande influência do Morrissey.  Pode nos contar algum detalhe?
(Risos)...Justin adora Morrissey e toda sua carreira.  Não sou um fã do Morrissey, então não posso defende-lo tanto quanto nosso vocalista, acho que é apenas uma demonstração do variado gosto musical dentro da banda.  Respeito muito a carreira do Morrissey, tenho algumas similaridades com ele pelo fato de também ser vegetariano mas nunca me recusaria de tocar em algum lugar só porque sinto cheiro de carne como ele fez recentemente.  Porém reconheço que ele tem muito a dizer em sua arte.  

8 - Se o mundo fosse perfeito...
Estaria em casa assistindo televisão e provavelmente não estaria aqui tocando rock and roll (risos).


EASTPACK ANTIDOTE TOUR 
READ MY LIPS - ALEXISONFIRE - ANTI-FLAG
Rocksound e Sala Apolo, Barcelona

Um privilégio para os fãs do punk-rock e hardcore que tiveram a oportunidade de passar o dia em Barcelona acompanhando de perto a Eastpack Antidote Tour. Neste dia tocaram Read My Lips, Alexisonfire e Anti-Flag. três bandas de distintas nacionalidades e idênticos objetivos: panfletar seus protestos, expressar suas insatisfações diante de seu público e não deixar de lado a melodia e o pensamento positivo, colocando a diversão acima de tudo.


Porém, para um grupo de mais ou menos oitenta pessoas este dia teve um atrativo a mais. O Anti-Flag ofereceu uma matinê (só para convidados) no bar Rocksound, lugar conhecido por seus shows underground onde o contato com o público é mais que direto. E não era uma simples matinê, o curto show de trinta minutos foi em homenagem ao Clash.


Porém nem tudo são flores, e mesmo com um presente destes o público não brilhou como esperado. Definitivamente não foi a sequência de músicas que falhou. Abriram com "London Calling", homenageando os trinta anos de lançamento do disco. Tivemos "Guns of Brixton", "I Fought the Law" e "Police on my Back", executadas com fidelidade mas nem mesmo Chris 2 decolando com seu baixo durante "White Riot" foi suficiente para transformar o bar num caos como estava previsto. Diversos motivos podem ter influenciado para tal "falta" de receptividade. É de praxe que o público catalão não vibre tanto. Outro fator é que a grande maioria era de jovens, muito jovens, e talvez o Anti-Flag lhes traga mais emoção do que o Clash e a euforia tomou conta mesmo quando o show terminou e os fãs puderam realizar o desejo de tirar suas fotos junto de seus ídolos.


Já o público da noite ofereceu melhor resposta. Desde a abertura, com READ MY LIPS. que a Sala Apolo já parecia ferver. O grupo espanhol apresentou músicas de seu único álbum, News for the Aflicted, com muita melodia e nítida influência de Good Riddance. Ótimo show que deixou o público bem aquecido para os canadenses do Alexisonfire que, com o lançamento de seu novo álbum, Old Crows Young Cardinals, já começa a figurar entre os grandes nomes do post-hardcore desta década.


Com "Drunks, Lovers, Sinners and Saints", do aclamado álbum Crisis, deram início a uma devastadora apresentação. O quinteto demonstrou muita maturidade no palco com destaque absoluto para o baixista Steele, que parece ter verdadeiros espasmos enquanto executa sua função, de joelhos, quase em transe diante do público. Sem falar no guitarrista com pinta de rockabilly Wade Macneil, que tem grande participação nos vocais.


Muita melodia foi exposta nesta apresentação e aquela emoção que faltou na tarde por parte do público sobrou no show do ALEXISONFIRE. "Boiled Frogs" foi o terceiro passo, esta já bastante conhecida por conta de seu clipe. Com "Young Cardinals" a sala Apolo se transformou num gigante mosh-pit. "Born and Raised" foi uma das que deixaram todos arrepiados, acompanhando cada palavra do refrão.


Tive a oportunidade de encontrar a banda no exato momento em que deixavam o palco e se reuniam no backstage após encerrarem com "Hapiness by the Kilowatt" - era nítida a cara de satisfação dos integrantes, era unânime: o show tinha superado as expectativas.
Estava armado um grande problema para o ANTI-FLAG - manter o nível de satisfação do público após duas grandes apresentações que se chamarmos de abertura é injustiça. Mas os americanos não iriam falhar na apresentação de seu novo material, justo o disco que vem sendo considerado o retorno às raízes, The People or The Gun.


Para quem esperava uma abertura hardcore se enganou. De cara apresentaram "The Press Corpse", de For Blood and Empire, que tem uma pegada mais ska e deu o tom da festa. Os stage-dives brotavam de todos os lados e a segurança local sem saber o que fazer queria partir para a ignorância, até se fazer necessária a intervenção da banda para que violência não ocorresse. Logo em seguida, a música que abre o atual lançamento "Sodom, Gomorrah, Washington D.C." apresentou a versão mais punk e esperada da banda.


A apresentação deu uma quebrada no ritmo com "Turncoat", por seu perfil mais pop, mas foi válido. Os animos voltaram a aquecer com "War Sucks, Let's Party!". Assim foram variando o ritmo sem se tornarem cansativos, numa sequência que incluiu "The Economy is Suffering...Let it Die", "The Smartest Bomb" (do The Bright Lights of America ,o último a ser lançado pela grande RCA) e ainda a bem levinha "1 Trillion Dollar", antes de "Police Story".


Para os que não tiveram a oportunidade de participar da festa Clash da tarde encerraram com "Should Stay or Should I Go". Retornaram para o previsto bis mas fugiram da rotina quando na velocidade de um pit-stop desmontaram a bateria e a remontaram no meio do público - loucura geral para a última sequência da noite que incluiu "Die for the Government", "Cities Burn" e "Power to the Peaceful".

Nenhum comentário: