sexta-feira, 24 de abril de 2009

Estrella Damm Primavera Club 08: festival indie passa pelo folk e termina com festa soul


Texto e Foto: Mauricio Melo

Festival fechou 2008 em Barcelona, com Isobell Campbell & Mark Lennegan, entre outras atrações
por Mauricio Melo
de Barcelona, Espanha
[02/01/2009]
Este festival, realizado em Barcelona e Madri como de hábito, demonstrou mais uma vez toda sua força em pleno inverno europeu, e principalmente na capital espanhola, que esgotou entradas para todas as apresentações. Por ser um festival de inverno, as apresentações não foram [obviamente] realizadas ao ar livre. Aqui em Barcelona se resumiram às tradicionais Sala Apolo e Apolo [2] e ao excelente Auditório Fòrum. No Apolo ficaram as apresentações mais rock, indie e os DJ's. O Auditório Fòrum teve as apresentações mais intimistas, mas também de maior público.
Noite de abertura - 10/12
A primeira noite do festival foi realizada no Apolo e contou somente com bandas nacionais. Os encarregados de abrir a foram os madrilenhos do The Joey K-Plan, mais uma dupla no mesmo formato de Black Keys, White Stripes ou The Kills, porém com som apenas instrumental e bem barulhento, sem deixar de lado a melodia. Fizeram uma excelente apresentação de abertura e saíram muito aplaudidos do palco. Em seguida foi a vez da banda local (lo:muêso) que fizeram um excelente show, talvez o melhor da primeira noite. Com músicas como Combinado Magyar, OJ da Jazen e Twelve 2 agradaram em cheio com seu estilo guitar/rock experimental e apesar dos títulos em catalão as músicas são cantadas em inglês. O encerramento ficou a cargo do rock/experimental do grupo 12Twelve, mais uma banda com bastante distorção e nenhuma letra. Fizeram um show bem interessante, mas quem levou o título da noite foi o (lo:muêso).
Segundo dia: primeiras atrações internacionais - 11/12
Segunda noite do festival, também realizada no Apolo recebeu um público maior do que a noite anterior e também suas primeiras atrações internacionais. Nesta noite de quinta-feira, somente duas bandas se apresentaram, ambas britânicas. A primeira da noite foi The Wave Pictures [foto] que lançando seu segundo álbum Instant Coffee Baby [2008], fez um show simples e agradável. Músicas como I Love You Like a Madman e Strange Fruit or David, ambas do segundo álbum, agradaram em cheio ao público catalão. Também não faltaram canções do primeiro trabalho Sophie [2006] como I Want to You Walk all Over Me e Pen Pals. A banda se sentia tão à vontade no palco que o baixista Franic Rozycki entre uma música e outra saiu para ir ao banheiro destinado ao público.
The Wave Pictures tem histórias curiosas em seus dez anos de estrada, à parte de um integrante sair no meio da apresentação para ir ao banheiro. Enquanto esperavam a gravadora lançar oficialmente seu primeiro disco, Instante Coffee Baby, a banda lançou Sophie reunindo gravações caseiras que vendiam em shows, no formato CD-R. Apesar das boas vendas de seus dois discos e de vários shows, os integrantes ainda têm seus empregos convencionais para conseguirem completar as despesas do mês.
Em seguida foi a vez de Darry Haymen & Jack Hayter subirem ao palco para um show dividido em duas partes. A primeira foi destinada a uma sessão acústica onde somente tocaram músicas de Hefner, um trio folk londrino surgido no início dos anos 90 e atualmente extinto - Haymen foi o líder desta banda. A segunda parte recebeu como convidados o mijão Rozycki e ainda o baterista Jonny "Huddersfield" Helm, ambos do The Wave Pictures, para completar a apresentação que a partir de aí misturava músicas de ambas as bandas, lembrando que Darry Haymen é padrinho do The Wave Pictures.
Terceiro dia - Auditório Fòrum abre suas portas para atuações mais íntimas.
Sendo fiel à sua proposta, Estrella Damm Primavera Club traz uma noite que vai de novas promessas a projetos de artistas consagrados do underground. Quem abriu a tarde de sexta-feira, às 17 horas, foi a banda local Manel com excelente apresentação, que confirma o posto de promessa local. Logo em seguida, foi a vez de Wovenhand, banda do enigmático líder do 16 Horsepower, David Eugene Edwards. Entre uma pausa e outra de sua banda oficial, no ano de 2001 surgiu Wovenhand como um projeto paralelo. Deu tão certo que atualmente estão lançando Ten Stones [2008], oficialmente seu quinto trabalho.
A única coisa que podemos lamentar da apresentação sólida que Edwards pode nos oferecer foi o pouco tempo destinado para a mesma, somente 45 minutos foram insuficientes para saciar a sede dos presentes, ainda que tocassem músicas como Horsetail e Kicking Bird do lançamento atual e Deerskin Doll do álbum Mosaic [2006]. completaram o setlist a pesada Tin Finger de Consider the Birds [2004] e porque não brindar seu público com American Wheeze, música de seu outro grupo, 16 Horsepower, presente no disco Hoarse [2001].
Este terceiro dia de festival e o primeiro no Auditório Fòrum ainda reservava mais uma novidade antes das duas atrações principais. Provenientes de São Francisco, sobem ao palco The Dodos. Oficialmente são uma dupla, mas nas apresentações torna-se trio, com Meric Long [violão e voz], Logan Kroeber [bateria] e um misterioso percussionista. Com uma apresentação bem calcada em músicas de seu segundo álbum, Visiter [2008], tocaram Fools, Red and Purple e do anterior, Beware the Maniacs [2006], uma das mais bem recepcionadas de todas, The Ball. Alguém do público ainda pediu Winter, do segundo trabalho, mas já não havia mais tempo, se bem que os rapazes passaram mais de uma hora no palco.
The Giant Sand inicia sua apresentação com um certo atraso, talvez o único do festival. Mesmo assim, o pequeno imprevisto não foi o suficiente para desprestigiá-los ou ameaçar a eterna tranquilidade de Howe Gelb, líder da banda que após a música de abertura se deparou com um público educadamente sentado nas confortáveis cadeiras do auditório. Aproximou-se do microfone e perguntou com sua grave voz, "alguma pergunta?"; o suficiente para quebrar o gelo. Lançando proVISIONS [2008] um disco que apesar de canções com uma roupagem bem folk/country e típicas de Tucson [Arizona-EUA], cidade natal da banda, é um disco com mensagens bastante políticas.
Quando Stranded Pearl foi tocada, a já esperada participação de Isobel Campbell aconteceu. Afinal, assim também foi registrada a canção no disco, e a moça fecharia a noite logo em seguida, apresentando seu projeto com Mark Lennegan. A apresentação dos Giant Sand durou pouco mais de uma hora e foi o suficiente para todos sentirem um pouco o calor do deserto em pleno inverno europeu, com músicas ao estilo Johnny Cash, Dire Straits e Calexico.
O encerramento da primeira noite no Auditório ficou a cargo de Isobell Campbell & Mark Lenegan [ abertura e foto ao lado], que este ano lançaram Sunday at The Devil Dirt. Logo na entrada do auditório, ao recolher o passe para fotografias a informação passada era de que a iluminação para esta apresentação seria bem baixa e que os artistas não abririam mão da atmosfera íntima que gostariam de transmitir, fazendo perfil ao trabalho de estúdio.
E foi assim que Campbell [ex-Belle and Sebastian] e o multi-intérprete Lenegan se apresentaram neste dia. Vale lembrar que a banda que projetou Mark Lenegan foi o Screaming Trees e que após a extinção desta o cantor se envolveu em vários projetos como participações em discos e shows do Queens of the Stone Age, o projeto eletrônico/rock/gospel Soulsavers, The Gutter Twins [dupla com ex-membro do Afghan Whigs], além de sua respeitável carreira solo.
O currículo do rapaz é extenso. Além de toda história que leva a dupla, vale citar que este trabalho de estúdio tem alto nível e o público presente teve a oportunidade de conferir cada acorde de músicas como Salvation, The Flame That Burns, Who Built the Road, além de trabalhos de um e de outro como Little Sadie, de Mark Lenegan, e ainda The Ballad of Broken Seas. Finalizaram a apresentação com Back Burner do disco mais recente. Algumas pessoas reclamaram do clima sombrio e do fato de Lenegan e Campbell não mostrarem seus rostos e nem dizer um olá. Talvez parte do público não tenha entendido o formato da apresentação.
Quarto Dia - Em mais um dia de novidades e rock, a revelação do soul americano rouba a cena
A abertura ficou por conta de Espaldamaceta, que mais serviu para aquecer quem tranquilamente chegava ao Auditório. Em seguida e com uma proposta bem distinta se apresentou High Places com seu Indie/Eletrônico vindo do Brooklyn. Em seguida foi a vez de Abe Vigoda de Los Angeles, mais uma banda que mistura muitos instrumentos na tentativa de fazer algo bem diferente, conseguem com êxito mas os The Dodos agradaram mais na noite anterior com menos. Não vamos interpretar mal, os californianos fizeram excelente show e talvez pudessem ser encaixados em uma das noites do Apolo, junto a outras bandas mais plugadas.
La Buena Vida, outra banda nacional porém com uma levada mais pop, tocou seu primeiro disco Soidemersol [1997] na íntegra acompanhada de uma orquestra, praticamente em versão acústica e com um telão ao fundo onde exibiam imagens de mais de uma década de existência da mesma.
Porém, quem roubou a cena da noite e do festival, foi mesmo Eli "Paperboy" Reed com seu carisma, sua voz rouca e muito soul. Este rapaz de 25 anos de idade tem uma combinação não muito comum aos fãs da música soul: é branco, vem de uma família de classe média americana e nasceu em Boston onde a música soul não tem lá grandes forças. Ao que parece, a cidade ganha nos dias atuais um grande representante. Com muita simpatia colocou o até então comportado público para dançar como já era de se esperar. O que não imaginavam os seguranças do auditório é que Paperboy pedisse para que o público saísse de suas cadeiras e fosse o palco, onde não havia grade de proteção.
Antes da entrada de Eli Reed, o The True Lovers, banda que o acompanha, fez toda uma introdução com um dos saxofonistas chegando até ao microfone e perguntando se é com aquele entusiasmo que querem receber o rapaz de Boston. Com a banda detonando um soul e o saxofonista caprichando no solo, Eli Reed entra em cena bem ao seu estilo, terno, cabelo penteado e com um largo sorriso. Aí sim, vem o momento onde o público sai de seus lugares e dança o show inteiro. Foi assim em I`ll Take my Love With You e [Doin The] Boom Boom, Am I Just Fooling Myself, todas de Roll With You [2008], seu segundo trabalho, além da já conhecida I'm Tired of Wandering. A apresentação terminou com Eli e o público esgotados de tantos passos à lá James Brown. Aquele terninho que Reed utilizava na entrada e seu cabelo penteado ficaram para trás na terceira música, as únicas coisas que não saíram de seu corpo foram o sorriso e a expressão de satisfação.

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